Baixa qualidade do ar: uma questão de saúde pública
- ivbatistella
- 1 de dez. de 2021
- 4 min de leitura
A poluição atmosférica afeta nosso dia a dia e está conectada às mudanças climáticas

No dia 23 de agosto, a cidade de São Paulo registrou um índice “péssimo” de qualidade do ar pela primeira vez desde 1996. A poluição atmosférica, no entanto, não é um problema localizado: é um desafio para cidades em todo o país – e no mundo. Um relatório da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) calcula que a poluição do ar mata mais de 50 mil pessoas por ano no Brasil.
A poluição atmosférica é responsável por danos à saúde humana e ao meio ambiente. Os avanços científicos, datando desde 1980 até agora, permitiram ter a certeza desses danos, e sua evolução resultou em um “Guia de Qualidade do Ar” organizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que traz à tona os principais efeitos da poluição na saúde e estabelece limites de segurança para a população.
Segundo a OMS, “ao reduzir os níveis de poluição do ar, os países tendem a reduzir a carga de doenças e mortes por acidente vascular cerebral, câncer de pulmão, doenças cardiovasculares e doenças respiratórias crônicas e agudas, incluindo a asma”.
Para além dos impactos na saúde humana, a poluição também é responsável por danos ao meio ambiente – como a ação do ozônio na redução da produtividade agrícola, a ocorrência de chuva ácida e a acidificação de lagos e rios pela deposição de sulfato e nitrato; além da influência na mudança climática.
Como funciona a poluição atmosférica?
No seu estado ideal, a atmosfera tem em sua composição nitrogênio (78%), oxigênio (21%), vapor d’água e outros gases em menor concentração. Entre eles, estão os gases que ajudam a manter a temperatura da Terra em equilíbrio – os gases de efeito estufa (GEE), como o dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), ozônio (O3), entre outros.
Segundo um estudo da WRI (World Resources Institute) Brasil, o comportamento dos poluentes depende não só de sua emissão, mas também da química atmosférica, dispersão, meteorologia e topografia da região. Os poluentes podem ser: primários (emitidos diretamente da fonte para a atmosfera) e secundários (formados por reações entre os poluentes e os gases atmosféricos).

A legislação brasileira, a partir da Resolução Conama nº491 de 2018, estabelece poluentes atmosféricos como “qualquer forma de matéria em quantidade, concentração, tempo ou outras características que possam tornar o ar impróprio ou nocivo à saúde [...], danoso aos materiais, à fauna e flora”. Além disso, também estabelecem padrões de qualidade do ar e planos de controle para emissões atmosféricas.
Apesar de constar na legislação, o projeto se iniciou em 2018 e não apresenta datas definidas para as outras fases de contenção e redução de poluentes. O estudo realizado pela WRI Brasil afirma que isso gera uma insegurança em relação ao alcance desses padrões da OMS e não sinaliza a necessidade real e previsível de adequação aos poluidores.
Quais as fontes de poluição do ar no Brasil?
Segundo a Prof. Dra. Marcia Yamasoe, especialista em Mereologia Física e professora na USP, “a qualidade do ar é deteriorada pela emissão veicular, sobretudo os que utilizam o diesel como combustível. Em segundo lugar, as indústrias”. Também ressalta as queimadas como um fator a ser considerado.
O transporte é uma das principais fontes de poluentes urbanos, emitidos através da queima de combustíveis, principalmente os fósseis, mas também os biocombustíveis. Segundo a EPE 2020, estudo realizado para o Ministério de Minas e Energia (MME), o óleo diesel e a gasolina ainda representam 43% e 27% do consumo rodoviário.
Já as indústrias emitem poluentes tanto no processo de fabricação quanto na produção de energia e transporte dos produtos. O setor elétrico, também importante, tende a emitir mais poluentes em tempos de crise hídrica. Isso ocorre porque as usinas hidrelétricas – principal matriz energética do país – não conseguem suprir a demanda, sendo repassada para as termelétricas, que geram energia através da queima de combustíveis fósseis.

Quanto às queimadas, Yamasoe afirma que “além de partículas de aerossol, as queimadas emitem gases precursores que podem formar o ozônio troposférico, e também emitem gás carbônico, principal GEE de origem antrópica”.
A queima de biomassa libera um material particulado, conhecido como aerossol atmosférico, presente na fumaça e em diversos poluentes. Esse material atua na atmosfera condensando nuvens e mudando suas características. Dessa forma, a fumaça emitida impede a formação de gotículas de chuva, alterando o aspecto hidrológico e gerando um ciclo vicioso de queimadas e secas.
Marcia Yamasoe explica que os aerossóis são importantes para a formação de nuvens. Eles só se tornam um problema quando sua concentração na atmosfera é muito alta, podendo inibir a ocorrência de chuvas ou atrasá-las. Esse atraso pode fazer com que as nuvens fiquem ainda maiores, provocando tempestades severas.
Baixa qualidade do ar e mudanças climáticas

O mais recente relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) responsabiliza a humanidade pela alteração de 1,2°C no planeta. A pesquisa aborda a razão das alterações no clima, quais suas implicações futuras e como é possível amenizar as consequências.
O que deve ser feito?
O Brasil apresenta uma legislação ambiental relevante, embora os padrões de qualidade atmosférica não sejam atendidos na maioria dos municípios e não haja nenhuma punição aos órgãos responsáveis. Além disso, existem brechas e incertezas na legislação que afetam sua eficácia.
Segundo o estudo do WRI Brasil, é preciso estabelecer prioridades que podem ser alcançadas pela formulação e implementação de políticas públicas. Dentre elas, é necessário criar uma política nacional sistêmica de qualidade do ar garantida por lei; ter um plano claro e cronometrado; estabelecer punições explícitas para o não cumprimento da qualidade atmosférica e fortalecer a comunidade científica por trás das medidas públicas.

Para Marcia Yamasoe, as alternativas podem ser individuais, como a redução de automóveis, optar pelo transporte público, bicicletas e compartilhamento de carona. “Quanto às queimadas, ter uma legislação mais rigorosa e intensificar a fiscalização e punição de quem descumpre as leis”, conclui.
Reportagem produzida para o Impacto Ambiental, projeto de extensão da UNESP Bauru ministrado pelo Prof. Francisco Rolfsen Belda. Texto originalmente publicado no dia 29/10/2021, com edição de Nayara Delle Dono e revisão de Catharina La Porta e Nayara Delle Dono. A reportagem original pode ser acessada através do link:
https://www.impactounesp.com.br/post/baixa-qualidade-do-ar-uma-questão-de-saúde-pública
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